terça-feira, 29 de junho de 2010

Dia sem Globo

Não é sobre futebol, é sobre tirania e juventude

Do blog Tijolaço, feito por Brizola Neto.

Esta madrugada [22 de junho] “bombou” no twitter a palavra de ordem #diasemglobo, que estimula as pessoas a verem o jogo entre Brasil e Portugal, sexta-feira, em qualquer emissora que não a Globo.

Não é uma campanha de “esquerdistas”, de “brizolistas”, de “intelectuais de esquerda”.

É a garotada, a juventude.

Também não é uma campanha inspirada na popularidade de Dunga, que nunca tinha sido nenhuma unanimidade nacional.

Na verdade, isso só está acontecendo porque um episódio sem nenhuma importância – um tecnico de futebol e um jornalista esportivo terem um momento de hostilidade – foi elevado pela própria Globo à condição de um “crime de insubordinação” inaceitável por ela.


As empresas Globo ontem, escandalosamente, passaram o dia pressionando a FIFA por uma “punição” a Dunga. Atônitos, os oficiais da FIFA simplesmente perguntavam: “mas, por que?”

A edição do jornal do grupo Globo, hoje, só não beira o ridículo porque mergulha nele, de cabeça.
O ódio a qualquer um que não abaixe a cabeça e diga “sim,senhor” a ela é tão grande que ela não consegue reduzir o episódio àquilo que ele realmente foi, uma bobagem insignificante.

Não, ela se levanta num arreganho autoritário e exige “punição exemplar” para técnico da seleção.Usa, logo ela, uma emissora de tanta história autoritária e tão pródiga em baixarias, a liberdade de imprensa e os “bons modos” como pretextos, como se isso ferisse seus “brios”.

Há muita gente bem mais informada do que eu em matéria de seleção que diz que isso se deve ao fato de Dunga ter cortado os privilégios globais no acesso aos jogadores.

E que isso lhe traria prejuízos, por não “alavancar” a audiência ao longo do dia.

Lembrei-me daquele famoso direito de resposta de Brizola à Globo, em 1994.

Não reconheço à Globo autoridade em matéria de liberdade de imprensa, e basta para isso olhar a sua longa e cordial convivência com os regimes autoritários e com a ditadura de 20 anos que dominou o nosso país.

Todos sabem que critico há muito tempo a TV Globo, seu poder imperial e suas manipulações. Mas a ira da Globo, que se manifestou na quinta-feira, não tem nenhuma relação com posições éticas ou de princípios.É apenas o temor de perder o negócio bilionário que para ela representa a transmissão do Carnaval. Dinheiro, acima de tudo.

Pois o arreganho autoritário da Globo, mais do que qualquer discurso, evidenciou a tirania com que a emissora trata o evento esportivo que mais mobiliza os brasileiros mas que, para ela, é só um milionário negócio.

Dunga não é o melhor nem o pior técnico do mundo, nunca foi um ídolo que empolgasse multidões. A sociedade dividia-se, como era normal, entre os que o apoiavam, os que o criticavam e os que apenas torciam por ele e pela seleção.

A Globo acabou com esta normalidade. Quer apresentá-lo como um insano, um louco incontrolável. Nem mesmo se preocupa com o que isso pode fazer no ambiente, já naturalmente cheio de tensões, de uma seleção em meio a uma Copa do Mundo. Ela está se lixando para o resultado deste episódio sobre a seleção.

De agora em diante, a Globo fará com Dunga como que fez, naquela ocasião, com a Passarela do Samba, como descreveu Brizola naquele “direito de resposta”: “quando construí a passarela, a Globo sabotou, boicotou, não quis transmitir e tentou inviabilizar de todas as formas o ponto alto do Carnaval carioca.”

Vocês verão – ou não verão, se seguirem a campanha #diasemglobo – como, durante o jogo, os locutores (aquele um, sobretudo) farão de tudo para dizer que a Globo está torcendo para que o Brasil ganhe o jogo. Todo mundo sabe que, quando se procura afirmar insistentemente alguma coisa que parece óbvia, geralmente se está mentindo.

Eu disse no início que esta não é uma campanha dos políticos, dos intelectuais, da “esquerda” convencional. Não é, justamente, porque estamos, infelizmente, diante de um quadro em que a parcela políticamente mais “preparada” da sociedade desenvolveu um temor reverencial pelos meios de comunicação, Globo à frente.

Políticos, artistas, intelectuais, na maioria dos casos – ressalvo as honrosas exceções – têm medo de serem atacados na TV ou nos jornais. Alguns, para parecerem “independentes e corajosos” até atacam, mas atacam os fracos, os inimigos do sistema, os que se contrapõem ao modelo que este sistema impôs ao Brasil.

Ou ao Dunga, que acabou por se tornar um gigante que nem é, mas virou, com o que se faz contra ele.

Eu não sei se é coragem ou se é o fato de eu ser “maldito de nascença” para eles, mas não entro nessa.

O ue a juventude está fazendo é o que a juventude faz, através dos séculos: levantar-se contra a tirania, seja ela qual for.

Levantar-se da sua forma alegre, original, amalucada, libertária, irreverente e, por isso mesmo, sem direção ou bandeiras “certinhas”, comportadas, convencionais.

A maravilha do processo social aí está. Quem diria: um torneio de futebol, um técnico, uma rusga como a que centenas ou milhares de vezes já aconteceu no esporte, viram, de repente, uma “onda nacional”.

Uma bobagem? Não, nada é uma bobagem quando desperta os sentimentos de liberdade, de dignidade, quando faz as pessoas recusarem a tirania, quando faz com que elas se mobilizem contra o poder injusto. Se eu fosse poeta, veria clarins nas vuvuzelas.

Essa é a essência da juventude, um perfume que o vento dos anos pode fazer desaparecer em alguns, mas que, em outros, lhes fica impregnado por todas as suas vidas.

E a ela, a juventude, não derrotam nunca, porque ela volta, sempre, e sempre mais jovem. E é com ela que eu vou.

terça-feira, 22 de junho de 2010

Renda maior faz 2,2 milhões de famílias saírem do Bolsa Família

Dados do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) informam que até janeiro deste ano mais de 4,1 milhões de famílias tiveram o benefício do Programa Bolsa Família cancelado. O principal motivo do corte é a renda per capita familiar superior à renda mínima estabelecida pelo programa. Mais de 2,2 milhões de famílias (54% dos casos) abriram mão do benefício ou tiveram o auxílio suspenso pela elevação da renda.

Toda família com renda mensal por integrante de até R$ 140 tem direito ao benefício. O valor varia conforme o tamanho da família, o número de crianças e adolescentes na escola. O auxílio vai de R$ 22 a R$ 200 por mês.

O motorista Eduardo Rodrigues, que mora em Osasco, na região metropolitana de São Paulo, e é pai de uma menina, abriu mão de R$ 40 mensais porque passou em um concurso público. “Não era justo continuarmos recebendo”. Também suspendeu o benefício Sônia de Morais Mendes, moradora de Belo Horizonte. Mãe de três filhos, recebia R$ 112 por mês. Ela aumentou a renda familiar porque voltou com o ex-marido e conseguiu trabalho. “Eu hoje não preciso mais desse dinheiro, por isso fui à prefeitura e dei baixa”, contou.

O vendedor da Feira Livre de Marília (SP) Osvaldo Dutra de Oliveira Primo, pai de dois filhos, precisou do benefício do programa por cerca de três anos. “Foi uma época que estava desempregado, com problema de saúde. Eu praticamente alimentava minha família com esse dinheiro”, lembra. Depois de voltar a trabalhar não sacou mais o auxílio. “Eu usei na extrema necessidade. Assim que tive condições, procurei dar baixa para que outras famílias pudessem ter o benefício”.

Para o governo, os pedidos de cancelamento mostram que o programa tem porta de saída. “Sempre teve”, comentou secretária nacional de Renda e Cidadania, Lúcia Modesto, quando o ministério divulgou o perfil das famílias beneficiadas pelo programa em 31 de maio. A professora Célia de Andrade Lessa Kerstenetzky, do Centro de Estudos Sociais Aplicados, Faculdade de Economia da Universidade Federal Fluminense (UFF) pondera que é “incontestável” que há uma saída, mas “o significado dela é menos claro”. Ela “especula” que a razão principal para a saída do programa deva estar relacionada com a melhoria no mercado de trabalho, “essa hipótese parece forte, dadas as evidências de crescimento da renda e do emprego”.

Na avaliação do economista Serguei Soares, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a porta de saída do programa é o crescimento econômico. “Ótimo que essas pessoas conseguiram sair, espero que outras consigam também, mas não vai ser pelo fato de que alguns conseguiram sair que a gente pode ter um acento ejetor ou vá responsabilizar o MDS pelas saídas. Essas dependerão do crescimento econômico”, comentou.

O Bolsa Família também foi tema de uma tese de doutorado defendida recentemente no Departamento de Sociologia da Universidade de Brasília (UnB). Para a autora da tese, Ana Lúcia Figueiró, o programa tem méritos, mas “abandonou a perspectiva inclusiva e fez opção pela gestão da pobreza”. De acordo com ela, o programa previa além da transferência de auxílio, assistência social, geração de emprego e renda, e a participação política. Ela avalia que essas ideias iniciais, já estabelecidas nas ações da cidadania contra a fome e nas discussões do Conselho Nacional de Segurança Alimentar foram abandonadas. “A transferência de renda é vista como um fim em si mesmo. Isso não deveria retirar o foco de uma política emancipatória”, assinala.

Atualmente, 12,6 milhões de famílias recebem um total de R$ 1,1 bilhão do programa. A meta do governo é chegar a 12,9 milhões de famílias até o final do ano e atingir grupos vulneráveis ainda não alcançados como os moradores de rua.

Fonte: Agência Brasil

domingo, 6 de junho de 2010

Educação Antirracista

O Brasil precisa se descolonizar culturalmente

Com nosso pensamento histórico voltado a civilização européia, nas escolas esquecemos de contar a constribuição dos povos não-europeus para a nossa formação histórica, social, cultura e econômica.

Palestra na UFRGS abordou a necessidade de resgatar nas escolas a contribuição não-européia na formação do Brasil.

No dia 27 de maio, no mês do trabalhador e da luta contra a discriminação, tive o privilégio de participar do 3º Seminário Antirracista da ASSUFRGS, no Auditório da Economia da UFRGS. A palestra da tarde versava sobre o papel da Universidade na promoção da Lei 10.639.

A Lei 10.639, para quem não sabe, propõe como uma política de Estado a obrigatoriedade na educação básica de duas ações: a primeira é implementar a história e a cultura afro-brasileira e Africana nos currículos escolares e a segunda ação é a comemoração do 20 de Novembro como Dia da Consciência Negra. É uma lei importantíssima, sancionada pelo presidente Lula em janeiro de 2003, que ainda não se implementou suficientemente nas escolas nem tampouco nos curriculos das licenciaturas das Universidades.

Apesar de alguns meritosos esforços institucionais pela implementação da 10.639 nas IES, como o que acontece desenvolvido por Rita Camisolão, da Pró-Reitoria de Extensão da UFRGS, que promove cursos de formação continuada para professores da rede básica de ensino, o fato é que muitas resistências têm sido enfrentadas para que a lei saia efetivamente do papel.

Segundo o Professor Adjunto de História Afro-Asiática da UFRGS Luiz Dario Teixeira Ribeiro, existe uma resistência interna no curso de História da Universidade para se tratar este tipo de conteúdo. Desde 81 existe a disciplina de História da África, mas como cadeira eletiva e não obrigatória. A Lei 10.639 serviu como elemento para pressionar a realização de um concurso para Professor de História da África, mas segundo sua avaliação, as resistências persistem, pois na Universidade ainda prevalece um pensamento eurocentrista.

O dirigente da União dos Negros Pela Igualdade (UNEGRO), José Antonio dos Santos da Silva reafirmou essa carência. "Quem foi João Cândido? Aposto que muitos não sabem que ele é gaúcho", afirma ele, referindo-se ao marinheiro nascido em Rio Pardo no RS, que em 1910 liderou a chamada "Revolta da Chibata", realizada em 1910 no Rio de Janeiro, que reivindicava a abolição dos castigos corporais na Marinha de Guerra brasileira.

Sobre isso Luiz Mendes, diretor do Sindicato dos Servidores da Justiça (SINDJUS), complementa afirmando que a história contada nas escolas omite a participação dos negros. "Vocês conhecem o nome de algum negro que lutou na Revolução Farroupilha? Provavelmente não. Será que os negros não lutaram? Eram todos covardes?", ironiza ele, para exemplificar que a participação de negros parece "apagada" do currículo oficial das escolas.

Da mesma forma deve-se acrescentar a imensa contribuição histórico-cultural dos povos indígenas para a formação do povo brasileiro. Também essa história é relegada a um segundo plano nas escolas. Só para citar um exemplo do Rio Grande do Sul, pouco se fala sobre personagens como Sepé Tiaraju, que liderou os guaranis no confronto a tropas luso-espanholas na Guerra Guaranítica no século XVII, deixando seu legado na formação da cultura missioneira do RS e do Brasil como um todo.

Por tudo isso, está mais do que na hora de nosso país se descolonizar também no pensamento. Precisamos resgatar o que temos de africano, de indígena, para construirmos uma identidade nacional soberana, autóctone. Já temos avançado nesse sentido, mas muito ainda precisa ser feito. As bibliotecas precisam de livros que abordem o assunto, as Universidades precisam de disciplinas, projetos de pesquisa, extensão, as escolas da educação básica precisam mudar seus currículos, a televisão e o cinema precisam dar sua contribuição. É um esforço de toda a sociedade no resgate da nosssa História contada por todos os seus escritores.