A jornalista Tereza Cruvinel, experiente na análise política brasileira, que cobriu o cenário político desde o período das Diretas quando retornou do Exílio, comentou no Correio Braziliense sobre o ceticismo eleitoral. As pesquisas eleitorais divulgadas no Ibope apontam um candidato sem rosto que está em segundo lugar nas eleições presidenciais. Trata-se da coligação "brancos e nulos". É uma coligação que obtém praticamente a soma dos votos de todos os candidatos nanicos, incluindo aí Randolfe e Eduardo Campos.
O governo Dilma e em especial o seu núcleo de esquerda devem analisar mais detidamente esse contingente eleitoral, que não enxerga em nenhum candidato um projeto que o represente. Qual é o perfil desse eleitorado? Sua escolaridade, composição de gênero, racial, social, etc. Uma hipótese me ocorre: a tão falada classe média de Marilena Chauí, suscetível ao bombareio midiático, encontra-se em crise de sonhos, em crise de projeto. Para onde vai essa parcela considerável da população?
Estive no Chile recentemente e conversando com o taxista que me conduziu do aeroporto ao hotel, descobri que no Chile o voto não é obrigatório, e houve uma baixa porcentagem de comparecimento às urnas. Depois, conversando com uma chilena sindicalista, fui informado que uma parcela significativa da juventude não se sente representada nem por Bachelet, nem por nenhum candidato. Parece o fenômeno identificado pelo filósofo Vladimir Safatle, de uma crise de representatividade do modelo de democracia liberal, que se apresentaria em nível mundial.
É inegável o papel da mídia nessa crise de representatividade. A aposta do monopólio midiático no descrédito a política, aos partidos, associando sistematicamente tudo que é político a corrupção, está intimamente relacionado com essa crise de representação. Outro responsável evidente é o próprio sistema político partidário, que produz um espelho distorcido da sociedade pelo poder das grandes empresas que financiam campanhas milionárias e deixando a maioria da população sub-representada.
A tão falada jornada de junho sacudiu as estruturas, mas não o suficiente. Não basta negar o modelo, é preciso apresentar um projeto alternativo, que chegou a ser rascunhado pela presidenta Dilma: constituinte específica para reforma política. A lúcida e correta resposta foi sufocada pelo fisiologismo. O velho e decrépito sistema corrompido pelo poderio econômico sufocou o novo projeto de política com mais participação popular.
É preciso que essa massa descontente com a política afirme mais claramente um projeto político, sob risco de ser cooptada pela extrema direita. O fascismo e o nazismo vigoraram em momentos de crise econômica e política. Se o bloco da descrença e ceticismo continuar fluido e difuso, os riscos de retrocesso dos avanços sociais serão maiores do que as perspectivas de avanços em mudanças que aprofundem a democracia.
Realmente é um tempo de encruzilhada para o Brasil e me arriscaria a dizer, para o mundo.
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