Não é a negação da política que vai combater a corrupção. Trata-se de debater soluções que alterem as regras eleitorais coibindo a influência do poder econômico sobre o político.
O ano de 2011 foi marcado pela intensa repercussão das práticas de corrupção dos políticos. O tema teve grande espaço na mídia televisiva, não somente na programação jornalística, mas em programas de humor como o Custe o que Custar (CQC) da Rede Bandeirantes, e o Zorra Total da Rede Globo, onde, de maneiras diferentes, a intenção pareceu sempre a mesma: ridicularizar os escândalos relacionados aos políticos de nosso país. A intensa exposição midiática da corrupção encontrou eco em algumas manifestações de rua, onde a revolta contra a corrupção foi muito mais uma forma de negação da própria política.
A intensa evidência que o tema da corrupção encontrou na mídia e na chamada opinião pública não deu espaço para o óbvio desdobramento de toda a revolta que as práticas corruptas pode causar. Afinal, quais são as causas e quais as possíveis soluções para a corrupção que revolta a opinião pública?
A cobertura jornalística que boa parte da mídia empresarial dá às denúncias de malfeitos públicos não contribui para a resposta dessa pergunta. Sem a preocupação de averiguar fontes, a mídia parece muito mais interessada no patrocínio de escândalos e na destruição de biografias sem a necessária apuração das denúncias. A fórmula tem sido sempre a mesma. Alguém denuncia sem necessariamente apresentar provas e a mídia divulga as denúncias em tom de condenação. Antes que o Poder Judiciário julgue, a mídia já o fez. A reputação do acusado já está maculada, independentemente do resultado das investigações, e o que é pior, a reputação da própria política sofre mais um golpe.
Esta conduta da mídia hegemônica não contribui para o fortalecimento da cidadania. Não constrói alternativas. Somente reforça a ideia equivocada de que a política é algo a priori sujo, do qual os “cidadãos de bem” devem manter distância. Está ideia equivocada pode inclusive se desdobrar em soluções de quebra do Estado de Direito, como a instituição de regimes antidemocráticos com o pretexto da “restauração da ordem” e da “limpeza ética”. Vale lembrar que o golpe militar de 1964 no Brasil foi justificado pelos grandes jornais nacionais da época – a maioria deles ainda em funcionamento hoje e com grande influência – justamente como uma forma do combate a corrupção do governo João Goulart. Não é à toa que este setor da mídia recebeu a alcunha de Partido da Imprensa Golpista (PIG). É um comportamento desestabilizador da democracia que possui raízes históricas.
Por isso, cabe aos setores progressistas da sociedade a oxigenação do debate sobre a corrupção. Não se trata da proteção de corruptos, que devem ser punidos não importando a sigla partidária a que pertençam. Toda a denúncia deve ser averiguada, pois o Estado em suas diferentes instâncias, é financiado pelos impostos da população, e qualquer uso indevido das verbas públicas causa danos diretos a serviços essenciais principalmente para os setores mais carentes da sociedade. No entanto, a corrupção deve ser combatida com seriedade. É necessário muito mais que instigar a revolta com maus políticos para combater a corrupção. Trata-se de fomentar uma profunda discussão sobre uma reforma das regras eleitorais e políticas.
E já que a mídia empresarial não parece interessada em patrocinar esta discussão, que o façam as inúmeras iniciativas de mídia contra-hegemônica: a blogosfera, as redes sociais, as rádios e tevês comunitárias, os sítios eletrônicos e jornais impressos de sindicatos, movimentos sociais e partidos políticos de esquerda, todos devem dar sua contribuição para este debate que interessa a todos nós: quais as bases para uma reforma política democrática que combata efetivamente a corrupção em nosso país?
Algumas propostas já foram apresentadas. A questão do financiamento das campanhas eleitorais é uma delas. Atualmente, o financiamento privado é permitido, o que gera campanhas milionárias, nas quais as empresas distribuem doações gigantescas para candidatos de todas as siglas, dificultando sobremaneira que o poder econômico não influencie o poder político. Uma alternativa poderia ser o financiamento público exclusivo das campanhas. Desta forma, cada candidato receberia uma verba bem menor do que os atuais orçamentos milionários, sendo impedido de receber doações do setor privado. Esta medida coibiria boa parte da gênese da corrupção, que está justamente na relação espúria estabelecida entre candidatos e financiadores das campanhas.
As regras do jogo como estão hoje favorecem a submissão do poder político ao poder econômico. Em outras palavras, quem tem dinheiro, tem poder. O fortalecimento da democracia e o combate a corrupção está justamente na criação de medidas que coibam a influência do poder econômico sobre a política e os políticos. Só que isto a mídia hegemônica não debate, porque a ela também não interessa, financiada que está pelo mesmo poder econômico que corrompe os maus políticos.
Aos setores contra-hegemônicos cabe provocar essas discussões: quais as alternativas coibiriam a relação espúria de influência do poder econômico sobre o político? Não se pode esperar que a Globo agende esse debate. Cabe a contra-hegemonia exercer seu poder cada vez mais crescente de agendamento para pautar o efetivo combate a corrupção.
Igor Corrêa Pereira
Téc. Administrativo da UFRGS
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